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Domingo, 26 Outubro 2014 14:05

Indicada na Fifa pela 12ª vez, Marta viaja ao Azerbaijão em missão da ONU

Fonte/Escrito por  globoesporte.globo.com
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Vida da brasileira é usada como exemplo no Fórum Mundial da Juventude: "Fico feliz em poder usar a minha história como incentivo", diz embaixadora da boa vontade

Por Patricia Esteves/ Rio de Janeiro 

Marta Brasil (Foto: Getty Images)Marta é a maior jogadora brasileira de todos os tempos (Foto: Getty Images)

Lá do interior de Alagoas para o topo do mundo. Assim foi a carreira da brasileira Marta. Entre as dez melhores do planeta pela 12ª vez consecutiva – ela já abocanhou cinco prêmios -, a jogadora vive novamente a ansiedade de saber se participará da eleição da Fifa, que acontece dezembro com premiação em janeiro. Antes disso, porém, Marta tem compromisso importante na próxima terça-feira. Como embaixadora da boa vontade do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, a camisa 10 da seleção brasileira estará em Baku, capital do Azerbaijão, liderando um painel sobre a importância do desenvolvimento do jovem utilizando o esporte como ferramenta de inclusão social, no Fórum Mundial da Juventude. 

- Se formos nos basear em todas as dificuldades e preconceitos que enfrentei na vida, sem dúvida (me sinto um exemplo para os jovens). Como embaixadora da ONU, é exatamente isso que tento combater. Tento incentivar os jovens a seguirem seus sonhos. O esporte é uma ferramenta muito forte para formar cidadãos. Foi isso que aconteceu comigo. Fico feliz em poder usar a minha história como incentivo – disse, por telefone.

Além da apresentação, a brasileira participará também de um evento com crianças carentes no dia seguinte, ocasião na qual tentará passar um pouco da sua habilidade com os pés para elas.

Mas se hoje Marta tem esse papel, o início da trajetória não foi dos mais fáceis. Caçula de uma família de três irmãos – José, Ângela e Valdir -, a alagoana teve que dar duro para chegar onde está. O principal obstáculo foi o preconceito, que começou dentro de casa. Sem a figura do pai e com a mãe trabalhando fora o dia todo, a ainda franzina Marta teve que enfrentar o irmão mais velho para ir, aos 14 anos, em busca do sonho no Rio de Janeiro. Começou no Vasco, em 2000, e logo ganhou notoriedade. Depois de passar pelo Santa Cruz de Belo Horizonte, se transferiu para a Suécia em 2004. Lá a brasileira conquistou o mundo.

Hoje com uma vida confortável, Marta atualmente defende o Rosengard, em sua segunda passagem pela Suécia. Depois de ver o Tyreso fechar as portas, a apoiadora passou a vestir a camisa do maior rival e ajudou as companheiras a conquistar o título sueco de forma antecipada. Os únicos compromissos agora são com a Copa da Suécia e com a Champions Legue. Na competição continental, o Rosengard enfrenta o Fortuna, no dia 13 de novembro, em partida válida pelas oitavas de final.

Marta Rosengard  (Foto: Divulgação)Marta tem contrato com o Rosengard até dezembro deste ano (Foto: Divulgação)

Mas nem tudo é trabalho para a camisa 10. As horas vagas são preenchidas com música e novela. Isso mesmo. A maior craque do país é fã das histórias diárias que fazem parte da vida dos brasileiros.

- Vejo pela internet. Atualmente só acompanho “Império”. Adorava “Flor do Caribe”. Acho que é porque sinto muito saudade da minha terra e tinha aquele marzão de Natal, que acabava me lembrando Alagoas. Ficava matando a saudade – relembra.

No fim do ano, Marta enfim poderá matar a saudade dos familiares e de Dois Rios, cidade onde nasceu. Além de vir ao Brasil para disputar o Torneio Internacional de Futebol Feminino - contra EUA, China e Argentina - em Brasília, a jogadora planeja a inauguração de um campo society. A festa, no entanto, não será grande, avisa Marta.
 
- Não vai ser nada de outro mundo, mas quero algumas companheiras da Seleção jogando comigo. Aproveito para fazer o meu apelo ao técnico Vadão para nos liberar. Está tudo programado e é uma coisa que me dá muito prazer de fazer. Sei como é a vida das pessoas de lá e o pouco que a gente faz, se torna muito grande para eles. Fico feliz de poder estar interagindo de alguma forma – encerrou.

Confira a entrevista na íntegra:

GLOBOESPORTE.COM: Você é uma das cinco mulheres no mundo embaixadora da ONU e estará em missão no Azerbaijão durante o Fórum Mundial da Juventude. Se sente um exemplo para os jovens?

MARTA: Se formos nos basear em todas as dificuldades e preconceitos que enfrentei na vida, sem dúvida (me sinto um exemplo para os jovens). Como embaixadora da ONU, é exatamente isso que tento combater. Tento incentivar os jovens a seguirem seus sonhos. O esporte é uma ferramenta muito forte para formar cidadãos. Foi isso que aconteceu comigo. Fico feliz em poder usar a minha história como incentivo.

GE: Você acaba de ser indicada pela Fifa entre as dez melhores jogadoras do planeta. Como é estar nesse grupo seleto pela 12ª vez consecutiva?

M: Fico sempre muito feliz quando vejo esses resultados. É realmente uma honra estar há doze anos sendo lembrada. Lógico que entramos em campo querendo ajudar a equipe, mas no final de tudo, colher os frutos do trabalho é muito bom. Ele sendo feito da melhor maneira possível, acho que vai acontecendo naturalmente. Infelizmente não consegui vencer a Champions League (do ano passado com o Tyreso), mas acho que tive uma participação muito boa na equipe. Principalmente na final, que foi decidida em detalhes. Joguei machucada e consegui fazer dois gols de perna direita, que não é o meu forte (risos). Não é à toa que estou novamente entre as dez. Foi com essa participação e com a continuidade do meu trabalho aqui no Rosengard que estarei torcendo para estar entre as três de novo. Isso já é muito grande para mim.

Marta bola de ouro (Foto: Getty Images)Marta na cerimônia de premiação Bola de Ouro da Fifa em 2013(Foto: Getty Images)

GE: Nas premiações da Fifa vemos uma Marta diferente da que estamos acostumados a ver dentro de campo. Você é vaidosa? Tem alguém que te ajuda a montar o visual para esses grandes eventos?

M: . Tenho minhas amigas e minha madrinha Riso, que me dão toques. A Renata, esposa do meu agente, me ajuda muito também. Foi ela que me ajudou nas últimas cerimônias. Elas conhecem o meu gosto. Mas eu que dou o aval final, porque só uso o que acho bonito e me sinto bem. Nada ali uso só porque está moda. Nos últimos anos passei a me cuidar mais. Percebi que as pessoas começam a te acompanhar, então fiquei mais vaidosa. Fui indo por esse caminho e gostando. Antigamente, dificilmente eu me maquiava. Não faço (maquiagem) para jogar, porque acho que não tem nada a ver. Mas extracampo e nos momentos que pedem um cuidado maior, sempre procuro estar bem.

GE: Quando você não está dentro de campo, o que costuma fazer?

M: Agora está começando a ficar frio (aqui na Suécia), então procuro  ficar conectada, falando com minha família e acompanhando as notícias do Brasil. Gosto de ficar em casa. Vejo as novelas também. Vou dormir já pensando nos capítulos seguintes (risos). Atualmente só acompanho “Império”, mas adorava “Flor do Caribe”. Acho que é porque sinto muito saudade da minha terra e tinha aquele marzão de Natal, que acabava me lembrando Alagoas. Ficava matando a saudade

GE: Sente muita saudade de Dois Riachos?

M: Hoje não posso dizer que sinto tanta, porque a internet nos ajuda a ter notícias. Porém, quando vejo imagens das praias, do campinho em que jogava, aí volta aquela vontade de querer estar lá. Sinto muita falta de conviver com minha família e meus amigos. Tento fazer isso todo o ano. Este ano estou fazendo um campo de futebol society e combinei com algumas amigas de jogar lá. Chamei a Maurine, a Fabiana... Faremos a inauguração no dia 5 de dezembro, nada muito grande, mas vamos ter um jogo feminino. Não vai ser nada de outro mundo, mas quero algumas companheiras da Seleção jogando comigo. Está tudo programado e é uma coisa que me dá muito prazer de fazer. Sei como é vida das pessoas de lá e o pouco que a gente faz, se torna muito grande para eles. Fico feliz de poder estar interagindo de alguma forma. Aliás, fica meu apelo para o técnico Vadão liberar as meninas para o jogo. E me liberar também caso eu seja convocada (risos)!

GE: Além do Torneio Internacional de Futebol Feminino em dezembro, estamos às vésperas de um Mundial, no ano que vem, e de uma disputa de Jogos Olímpicos em 2016. Essa primeira competição será uma espécie de preparação para esses grandes torneios?

M: Sem dúvida. A seleção americana é exatamente a equipe que podemos nos basear para ver onde podemos melhorar e descobrir qual é a nossa situação atual.  As meninas fizeram um belíssimo trabalho conquistando a Copa América, mas precisamos de testes como esse para sentirmos o que pode melhorar. Precisamos sentir o que é jogar com uma seleção campeã olímpica e uma das nossas maiores rivais. Vai ser importante para ver a questão da competitividade.

Marta gol Brasil (Foto: Getty Images)
Marta veste a camisa 10 da seleção brasileira desde 2003 (Foto: Getty Images)

GE: Você não joga com a camisa da Seleção há quase um ano. Isso é uma questão de incompatibilidade de datas? Sente saudade?

M: Tenho muita saudade de jogar na seleção. As pessoas perguntam muito e eu fico sem saber o que responder. A seleção feminina, infelizmente, ainda não tem um calendário fixo e aí ficamos sabendo pouco tempo antes (dos jogos). O que acontece é que fica muito difícil para nós, que jogamos fora do Brasil, estarmos junto quando não é uma data Fifa, porque os clubes não querem abrir mão de suas atletas. Na Copa América foi isso que aconteceu, porque não era uma competição dentro do calendário da Fifa. Fica então o meu apelo para que possamos fazer um calendário baseado no da Fifa. Assim poderemos estar aptas a servir a seleção. 

GE: Quanto à junção do futebol feminino ao Bom Senso, como você enxerga esse movimento?  

M: Acredito que quando estamos batalhando por algo melhor para a modalidade, tudo é válido. O futebol feminino há muitos anos está batendo na mesma tecla. Até hoje não chegamos nem a 50% do que tem o masculino, apesar de enxergar que, mesmo a passos lentos, estamos caminhando. Ainda tem muito a melhorar. Precisamos de apoio e estrutura para termos condições de podermos nos dedicar mais ao trabalho, sem que as meninas precisem buscar algo fora. Precisamos viver como atletas. Todo mundo já conhece esse meu discurso. Sou uma batalhadora desde que deixei minha família para brigar contra tudo e contra todos para me tornar atleta. É uma batalha constante.

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