Além de conteúdos de gastronomia, artes, entretenimento, música, jogos e celebridades, que o transformaram em um capítulo à parte na cultura da internet, o YouTube também ensina a jogar futebol. O canal de Falconi, chamado "Eu treino fundamento", como o próprio nome indica, traz vídeos com dicas práticas e orientações sobre passe, drible, cabeceio e finalização, movimentos básicos da modalidade.

"O objetivo é estimular treinadores e jogadores a aperfeiçoar a parte técnica", disse o ex-lateral-direito que atuou em clubes como Bragantino, Portuguesa, Mixto-MT e Internacional, de Bebedouro (SP), em 10 anos de carreira, entre 1996 e 2006.

Futebol no YouTube ainda está no campo da inovação e Falconi é um dos pioneiros a ensinar futebol virtualmente. O técnico Valdir Espinosa, campeão mundial com o Grêmio, possui um canal para ensinar táticas e também dá dicas sobre posicionamento para os atletas. Zico alia histórias do futebol, conselhos técnicos e também entrevistas.

Por outro lado, vários canais ainda trazem apenas os chamados "tutoriais", neologismo usado em informática para ensinar o funcionamento de programas para usuários iniciantes.

Criado pelo jornalista e também ex-jogador Lucas Queiroz, o canal "Brazil Kickers", dirigido a jogadores amadores, é um dos mais vistos no segmento. "Procuro fazer lances que possam ser feitos nos jogos", disse o youtuber, que atuou apenas nas categorias de base. "Não sou o melhor jogador de futebol, mas sou um dos bons apresentadores do YouTube", afirmou.

As iniciativas, especialmente as páginas que ensinam fundamentos, preenchem uma lacuna no futebol brasileiro: a falta de treinos específicos para aperfeiçoar a técnica. "Nunca tive treinos técnicos. Fui mandado embora da usina de cana de açúcar e fui fazer um teste. Passei no profissional do CRB. Tive de aprender na raça", contou o ex-atacante Aloisio Chulapa.

Nos times profissionais, poucos clubes no Brasil ensinam o jogador a bater na bola ou adotar a posição correta para "matá-la" no peito. O ex-jogador Amoroso, hoje embaixador do Boca Ratón, clube norte-americano da quarta divisão, achou a iniciativa de ensinar fundamentos na internet tão importante que levou o próprio Falconi para conduzir a primeira clínica esportiva do clube no Brasil, realizado no mês passado, no hotel Bourbon Atibaia, em São Paulo. "Eu cresci com a técnica. No início da carreira, futebol não é só jogo. A técnica é mais importante que a tática ou físico", disse o ex-jogador do São Paulo.

Joshua, filho de Pelé, é um dos assinantes do "Eu treino fundamento". Jogando por uma universidade nos Estados Unidos, depois de passar pelas categorias de base do Santos, o atacante gravou até um vídeo para apoiar o canal. Cristiane e Andressa Alves, da seleção feminina, fizeram o mesmo.

Os canais dedicados ao futebol não têm a mesma visibilidade de outras áreas. O site Social Blade, responsável por mostrar estatísticas sobre YouTube, Instagram, Twitter e Twitch, aponta que o maior canal de YouTube do Brasil, em número de visualizações, pertence ao funkeiro Kondzilla, com 5,5 bilhões de views. Os maiores canais de futebol atraem 10% disso.

Pollyana Ferrari Teixeira, professora da Pontifícia Universidade Católica (PUC/SP) e pesquisadora de Mídias Sociais, aposta no crescimento. "Esse desenvolvimento tardio se deve à grande influência das transmissões da tevê aberta. O futebol ainda possui estruturas tradicionais de comunicação, mas existe uma brecha que vai fazer o esporte explodir nas mídias sociais", disse a especialista. "O vídeo se consolidou como grande plataforma de comunicação em todas as áreas", completou.

Sem internet em casa, o meia Pedro Henrique Lourenço da Silva, que procura um clube para atuar, só consegue assistir aos vídeos na casa da tia. Aos 15 anos, ele conta que conseguiu melhorar a potência dos chutes só corrigindo a distância do corpo em relação à bola, dica que viu nos vídeos de fundamentos. Ele relata que, por isso, as visitas à casa da tia estão se tornando cada vez mais frequentes.